Estávamos muito com os nervos à flor da pele ontem. E o day after do pleito, com nosso coração mais calmo e nossa cabeça mais oxigenada, agora nos permite oxigenar melhor nossas ideias.
Agora de manhã eu me deparo com o seguinte tuíte do influenciador digital Felipe Neto:
Analisando por este aspecto o ponto de vista é plausível, visto que a extrema direita estava turbinada com doações de empresários e verbas do orçamento secreto.
Algumas coisas a gente precisa tirar dessa eleição. Eu vou enumerar algumas:
- Precisamos voltar para a base: boa parte da população que antes corria com a gente, hoje se sente desprestigiada e desassistida. A questão é identitária é muito relevante, mas o que a gente entende é que as pessoas que antes atuavam com mais presença nos sindicatos, igrejas, associações de bairro e movimentos sociais urbanos e rurais se “burocratizaram”. Colocaram tudo nas mãos do poder público, como se a tomada do poder político fosse uma solução para os problemas do país. A solução só acontece nas urnas e, principalmente, nas ruas. A disputa de espaços entre a esquerda e direita é real e a gente denunciava isso desde o aliciamento de fiéis para as eleições de conselhos tutelares, e representantes chapa-branca em cargos diretivos de caixas de assistência e previdência de estatais, sindicatos e associações de bairro, há muitos anos. Assim, pessoas sem identidade com as massas estão emergindo, com o espaço deixado e abandonado por lideranças, antes aguerridas.
- Precisamos de colocar o coletivo acima de vaidades: a eleição para senador no Río de janeiro desta eleição mostrou que uma vaidade de um grupo de um partido provocou uma grande derrota. O PT do Rio de janeiro, em vez de apoiar a candidatura de Alessandro Molon do PSB, resolveu lançar candidatura própria, mesmo com as recomendações de boa parte da esquerda em não fazê-lo. O eleitorado se dividiu, e a direita, unida, votou em massa em Romário, que se reelegeu senador. A soma dos votos de Molon e o candidato do PT seriam suficientes para derrotar o PL na eleição para o senado no RJ. Essa fogueira de vaidades se tornou uma constante na esquerda brasileira, que, mesmo sob ataque da extrema-direita, não soube se unir, e manteve suas disputas internas. A desarticulação foi gritante e foi fundamental para a expressiva votação da extrema-direita e do Centrão nessas eleições.
- Precisamos de renovação política: eles estão se renovando. Nós, não. Ainda temos muitas lideranças que estão ‘datadas’ e que ainda carregam conceitos que já não deveriam estar mais no discurso da esquerda. Tem muito jovem, muita mulher, que poderia ter mais espaço na liderança política, e que não tem, pois velhos líderes ainda se impõem e não permitem a renovação política. Aí muita gente se desanima e vai para o centro ou para a direita.
- Precisamos de lideranças próximas das pessoas: isso casa com o primeiro item. O perfil das votações para deputado dizem bem o que estou dizendo. Boulos foi o campeão de votos para Federal, mas a Federação PSOL-Rede só elegeu 6 pessoas em São Paulo. Há uma cláusula de barreira agora no coeficiente eleitoral, impedido a eleição de candidatos com votação pífia. Muitos votos foram jogados fora, pois não conseguiram eleger ninguém. A estratégia eleitoral deveria ser mais pulverizada, com mais candidatos atingindo o índice. A direita fez isso muito bem. Mesmo não sendo campeão de votos, o partido de Eduardo Bolsonaro emplacou muitos candidatos com votação expressiva, e se elegeram.
- Precisamos de estratégia de campanha parlamentar regionalizada: este item conversa com o anterior. Mesmo que a eleição para deputado estadual e federal seja uma eleição geral, em que uma pessoa em qualquer do estado pode votar em um candidato, uma estratégia regionalizada se torna mais eficiente. Seria transformar em uma espécie de voto “distrital”, onde cada candidato teria uma região para focar sua campanha. Mesmo que não sejam todos os candidatos a fazer isso, a maioria deve atuar dessa forma para não haver “disputas fratricidas” com candidatos de um mesmo partido ou coligação disputando votos em um mesmo local, ou em um mesmo grupo de pessoas.
- Precisamos ter um compromisso pragmático e ideológico definido: uma das grandes armadilhas de uma democracia representativa como a do Brasil é que os partidos políticos tem que se sujeitar a regras eleitorais de representatividade para sobreviverem. E isso faz com que pessoas que não tem nenhum compromisso programático e ideológico com o partido se junta a legenda e comprometam a credibilidade e a coerência ideológica do partido. Não dá mais para colocar gente conhecida e que se destacou em algum momento para encabeçar uma candidatura. Vimos o exemplo do cabo daciolo no Rio de Janeiro. Ele liderou o movimento paredista de bombeiros, foi convidado a se filiar ao PSOL, mas depois viu-se que ele não tinha nenhum uma identificação ideológica com o partido, e saiu atacando a esquerda. Por outro lado, pessoas que têm um compromisso ideológico importante com a sigla, são desprestigiados porque é muito mais interessante para um partido o seu “potencial eleitoral” do que a sua coerência ideológica com os valores que o partido prega. É necessário que as pessoas que se filiam a um partido político recebam uma formação política, e que pessoas que comprovadamente estão utilizando o partido em causa própria sem nenhum compromisso e identidade ideológica seja excluídos da sigla, por mais potencial eleitoral que essas pessoas tenham. Do contrário, os partidos vão se render ao fisiologismo partidário e se igualar aos partidos de direita.
- Precisamos valorizar a nossa militância orgânica, aguerrida e apaixonada: levamos Lula para o segundo turno, o PT elegeu três governadores no primeiro turno e levou quatro candidatos ao segundo turno, o PT elegeu 12 deputados a mais do que em 2018 e o sol agora tem 12 deputados, dois a mais que 2018. O PV ganhou dois deputados e agora tem seis, a rede ganhou dois deputados. O PT tem 9 senadores, ganhou dois. São Paulo tem oito deputados estaduais a mais do que a eleição anterior o pessoal ganhou um deputado a mais do que a eleição anterior. Guilherme Boulos foi o segundo deputado federal mais votado do país com um milhão de votos. Tudo isso só foi possível porque nós temos uma militância orgânica, aguerrida, e apaixonada. Por que a direita e a extrema-direita podem pagar por tudo isso: pode pagar impulsionamento nas mídias sociais, tenho o domínio do algoritmo das mídias sociais porque as mídias sociais são capitalistas, podem contratar as melhores cabeças podem corromper qualquer um com dinheiro. Mas a militância de esquerda não tem disso. A maioria dessas pessoas está aqui porque quer um Brasil diferente, melhor e mais justo. Mas a gente percebe que pequenas lideranças que poderiam impulsionar uma boa parte dessa militância não estão sendo devidamente valorizados. O outro lado já construiu os seus currais com lideranças demagogas e utilizando do senso comum com muitos preconceitos e absurdos que estão incrustados na cultura brasileira e que precisam ser mudados.
- Precisamos ser firmes e claros em nossas posições: encampamos uma grande quantidade de bandeiras, que batem de frente com o conservadorismo que sempre limita as capacidades humanas por meio de doutrinação ideológica. É exatamente isso que eles fazem, doutrinação ideológica ou seja, nós somos acusados do que eles praticam todos os dias e com todas as ferramentas possíveis: mídia eletrônica e digital, igrejas jornais, propaganda. Eles não querem que as pessoas saibam os reais efeitos da cannabis. Eles não querem que as pessoas saibam dos direitos da mulher e da desigualdade de direitos reprodutivos entre a mulher e o homem. Eles não querem que você saiba sobre a diversidade sexual. Eles não querem que você saiba que o capitalismo da forma que está fomenta desigualdades. Eles não querem que você saiba o racismo estrutural e o genocídio preto indígena que ocorre diuturnamente nesse país. Eles não querem que você saiba que em nome do agronegócio estão se destruindo a floresta e oferecendo as pessoas uma alimentação de péssima qualidade com produtos ultraprocessados que fazem mal à saúde. E fugir do assunto, só favorece esses discursos da direita. é preciso enfrentar e defender a liberdade humana e o respeito ao próximo porque tudo isso que nós defendemos bate de frente com a opressão que eles querem impor.
- Precisamos fazer autocrítica: Esse é o ponto mais pesado que teimamos em não fazer. Todos nós somos mentes pensantes. Mas quando uma mente pensante aponta um problema que precisa ser resolvido, em nome de um corporativismo tolo, essa mente acaba sendo censurada, desprestigiada e marginalizada pelo movimento. Ouvir críticas internas faz parte do jogo democrático e do fortalecimento da ideologia e das ideias. Pois gado é só aqueles que estão do outro lado aceitando todas as mentiras que lhe são contadas.Precisamos ser diversos, mas sem impor conceitos aos outros: esse é outro ponto polêmico mas tem uma explicação para isso. Dentro da esquerda existem diversos tipos de movimentos: temos os marxistas, os leninistas, os trotequistas, os anarquistas, os da internacional socialista e outros tantos movimentos de esquerda inclusive moderados, reformistas e independentes. Dentro daquele conceito de fogueira de vaidades há uma disputa tola entre qual o conceito é o melhor. E essas disputas levam a desentendimentos, fragmentação, e desunião das esquerdas. É possível promover um debate com abertura para diálogo, desde que todas as partes estejam dispostas a conhecer a outra parte e discutir de maneira sábia e ordeira as questões pertinentes. A gente sabe que do outro lado todo mundo é unido em torno do dinheiro. A gente poderia aqui estar todos unidos em torno de uma causa, mas se divergem em relação ao método, e isso faz com que a coisa não ande.
- Precisamos ser coerentes naquilo que defendemos: se nós defendemos a causa feminista, a causa anti-racista, a causa LGBT, a causa PCD, a causa ambiental, a causa sindical, não podemos permitir que casos de racismo, homofobia, misoginia, capacitismo, e degradação ambiental façam parte dos nossos atos e procedimentos. Todos nós temos, enquanto militantes, a obrigação de conhecer todas as causas que nós defendemos para não agir em dissonância com essas causas. Pois a verdade é que todos nós somos vítimas de um mesmo sistema opressor e cada uma dessas violações de identidade é um tentáculo deste sistema. Ou seja, todos nós temos a obrigação de defender a todos aqueles que sofrem algum tipo de opressão. E não devemos nos render ao corporativismo de tentar esconder essas violações. For preciso cortar na carne para defender essas causas, tem de ser feito. Pois é necessário entender que a postura individual não deve servir de pretexto para uma defesa de um coletivo a essa postura reprovável.
É muito importante refletirmos esse momento. Pois a democracia está em uma situação crítica, pois vivemos uma crise de representatividade. Os representantes estão muito distantes dos representados. E isso provoca a anti-política, é um sentimento de aversão a decisão coletiva que a política nos traz. E isso se torna um terreno fértil para o fascismo, para uma política neoliberal que libere o capital de oprimir as pessoas. As pessoas precisam voltar a ter voz e vez. Figura do político não deve ser uma figura de impor um poder, e sim de trazer anseios das pessoas para um espaço de poder. E esse processo ele deve ser contínuo e continuado que parece uma redundância, mas é um processo que não deve parar por nenhum instante e deve fazer uso de todos os recursos possíveis para ser um agente transformador da sociedade. Nós temos a nós mesmos, e precisamos dar voz a quem não tem voz.
E política se faz com presença. Precisamos ocupar os espaços e resistir a todos os tipos de ataque. Nós sabemos que a direita e a Extrema direita querem deixar a esquerda acuada pois sabe muito bem que a revolução humana está contida nela. Que nossos ideais são construtivos e visam uma harmonia coletiva entre as pessoas. Que não temos medo dos anseios de liberdade e que não devemos nos render a ganância que faz com que cada mês mais pessoas se tornem miseráveis em detrimento de uma pequena elite que tem acesso a praticamente tudo. Lembrei da minha querida amiga Rafaela Boami, a mais jovem candidata a prefeita do país, que liderou o movimento de ocupação das escolas em Diadema movimento este que cresceu e houve ocupações em diversas escolas em São Paulo. Sua palavra de ordem “ocupar e resistir” deve ser um monte de todo militante de esquerda a partir de agora. Temos que disputar cada palmo de chão. Temos que resistir a todo tipo de provocação, intimidação e violência. Pois todos aqueles que tombaram nessa terra, lutaram por ela. E é por aqueles que tombaram, lutando por justiça, ainda lutamos.